Corredor
Ela não se lembra de ter dormido ali. Não se lembra de sequer ter deitado. Simplesmente se encontrou em pé, sozinha, em um corredor branco, iluminado por lâmpadas claras demais, que chiavam. O piso é extremamente limpo e brilhante, sem uma única marca que indique alguma presença anterior ali. As paredes são lisas, sem rachaduras, quadros, janelas. Sem história. Só é possível ver várias portas idênticas alinhadas.
Ela toca a primeira porta, mas a maçaneta não se mexe.
A segunda, está trancada.
A terceira, também.
O corredor parece interminável. Ela começa a caminhar e seus passos ecoam. Um eco estranho, que responde com atraso, como se ainda estivesse aprendendo sua forma de andar.
De repente, ela olha para baixo e vê um tapete branco, quase camuflado no chão. Ela não se lembra de ter passado ali, mas fica difícil confiar em sua própria memória em um lugar tão estranho, mas reconhecível ao mesmo tempo.
Ela olha uma das portas mais a frente e vê algo: 613. A porta com o número não abre, assim como as outras. Ela anda mais alguns passos até achar outra porta com um número. 612.
Ela ri.
Mas a risada acaba rápido, sem eco, em um lugar sem espaço para isso.
É então que ouve. Passos vindos de trás. Não o eco atrasado de seus passos. Algo que não vinha dela, uma presença a mais, não sentida até então.
Ela se vira, mas não adianta, o corredor continua vazio. Vazio demais, limpo demais. Ela continua andando, sentindo um aperto no peito e no ambiente. O corredor parece se estreitar, a sensação de agonia cresce.
Até que ela vê: uma porta aberta. E corre, como nunca havia corrido na vida, até que consegue entrar.
A sala tem várias cadeiras enfileiradas, cadeiras demais, parecia interminável. Um dispenser de álcool vazio preso na parede. Luz fria e clara demais. De frente para as cadeiras, ela vê uma televisão antiga. Nas imagens, é possível ver uma pessoa deitada no chão, imóvel, em um quarto vazio.
Ela chega mais perto. O rosto da pessoa dormindo é o dela. Não uma cópia, não alguém parecido, não uma sombra. É ela.
Antes que pudesse entender a situação, uma voz saiu da televisão.
“Você de novo”
A imagem, porém, não se mexe.
A voz também é dela, mas mais velha, como se tivesse passado muito tempo ali. Um tempo que ela não se lembra de ter vivido.
“A gente sempre acha que acabou. E sempre volta.”
As luzes começam a piscar. Quando param, ela está de volta no corredor. Do mesmo jeito que antes. Branco, infinito, como algo que sabe que o fim nunca chega.
Ela entendeu algo então: a saída não existe. O que existe é o retorno.
E ela já tinha voltado antes.
Muitas e muitas vezes.